Os quatro tipos de sentimentos: primários, secundários, sistêmicos e metassentimentos.

26/11/2019

Os quatro tipos de sentimentos: primários, secundários, sistêmicos e metassentimentos.

“A diferença principal entre sentimentos primários e secundários é que os primeiros estimulam a ação construtiva, enquanto os secundários consomem a energia que, de outro modo, iria estimular mudanças. Sentimentos que geram ação efetiva fortalecem as pessoas. Os que embaraçam ou substituem a ação efetiva, ou ainda justificam a omissão, enfraquecem-nas. Chamo, pois, os sentimentos que geram ação construtiva de sentimentos primários e os outros de sentimentos secundários.

Os sentimentos primários são simples e não exigem descrição minuciosa. São fortes sem ser dramáticos ou exagerados. Por isso, embora excitantes e vívidos, trazem uma sensação de segurança e calma. Existem, é claro, situações dramáticas, às quais convêm emoções igualmente dramáticas. Há uma diferença, por exemplo, entre o medo dos soldados na frente de combate e o medo que sentimentos nos pesadelos.

Muitos sentimentos com que lidamos em terapia são secundários. Sua função principal consiste em convencer os outros de que não podemos encetar ação efetiva, razão pela qual têm de ser sentimentos dramáticos e exagerados. Quando sob o império de sentimentos secundários, somos fracos e os demais presentes sentem a necessidade de ajudar. Se as emoções forem suficientemente dramáticas, os que pretendem ajudar não percebem que, na verdade, pouco há a fazer em tal situação.

Quando as pessoas cultivam sentimentos secundários, evitam contemplar a realidade. Esta compromete as imagens interiores necessárias para manter esses sentimentos e prevenir mudanças. Quando essas pessoas “trabalham” com terapia, frequentemente fecham os olhos e se recolhem ao seu mundo particular. Respondem por outro modo ao que lhes é perguntado, mas quase nunca percebem o que fazem. Convém lembra-los de que devem abrir os olhos e observar o mundo. Eu costumo dizer-lhes: “Olhem para cá. Olhem para mim.” Se conseguirem abrir os olhos e ver realmente, mas ainda assim continuarem com o mesmo sentimento, é porque se trata de um sentimento primário. Mas se o sentimento lhes fugir tão logo abrirem os olhos e começarem a ver, podemos estar certos de que foram envolvidos por sentimentos secundários.

Quando sentimentos primários emergem na terapia ou na vida, os presentes demonstram naturalmente compaixão, mas sentem-se também livres para responder de maneira adequada. A pessoa que ostenta esses sentimentos permanece forte e capaz de agir efetivamente. Dado que eles conduzem a um objetivo definido, não duram muito: surgem, executam seu trabalho e vão embora. Não fazem rodeios. Resolvem-se graças a uma expressão apropriada e a uma ação efetiva, correta.

Os sentimentos secundários, por sua vez, duram mais e pioram com a expressão, ao invés de melhorar. Esse é o motivo básico pelo qual as terapias que encorajam a expressão de sentimentos secundários são tão demoradas.

Desejo corrigir também outro conceito errôneo sobre a perda de controle. É algo que aprendi com a Terapia Primal. Muitas pessoas supõem que, curvando-se a uma necessidade ou sentimento premente, perdem o controle. Não é verdade. Quando acedemos a um sentimento primário – por exemplo, à dor elementar de uma separação, a uma cólera justa ou a um forte desejo -, e confiamos plenamente nesse sentimento, tanto este quanto a necessidade são naturalmente controlados.

Os sentimentos primários vão até onde convém. Ninguém fará nada vergonhoso por causa de um sentimento primário, pois este sabe reconhecer os limites da vergonha. É muito raro que se zombe de uma pessoa que exibe um sentimento primário. Ao contrário, os outros em geral se comovem profundamente e participam da experiência.

Isso se aplica apenas aos sentimentos primários. Os sentimentos secundários não conhecem os mesmos limites à vergonha e é muito fácil bancar o idiota expressando-os. Não se pode confiar neles.

Mas os sentimentos secundários têm o seu fascínio. São dramáticos, excitantes, dão a ilusão de vida. Todavia, o preço dessa vida é as pessoas ficarem eternamente fracas e indefesas.

AS explicações ou interpretações também perturbam um cliente. Em vez de conduzir efetivamente as pessoas a seus sentimentos primários, elas tendem a mantê-los intoxicados de imagens que alimentam os sentimentos secundários.

O luto, por exemplo, pode ser primário ou secundário. O luto primário nada mais é que a dor lancinante da separação. Se nos submetemos à dor, permitindo que ela execute seu trabalho, o luto finalmente encontra sua própria saciedade e nós ficamos livres para começar de novo. Muitas vezes, entretanto, as pessoas recusam submissão ao luto, transformando-o, ao contrário, em sentimento secundário, autopiedade ou tentativa de atrair a piedade alheia. Esse luto secundário pode durar a vida inteira, inviabilizando uma separação limpa e terna, e negando a evidência da perda. Trata-se de um mau substituto para o luto primário.

A culpa primária conduz à ação saneadora. Se aceitamos a culpa, fazemos naturalmente o que é possível e necessário para corrigir os erros, endireitar a situação e viver com o que não pode ser mudado. A culpa secundária transforma a ação em preocupação. Não promove mudanças: na verdade, previne-as. As pessoas podem remoer um bom problema durante anos, como o cão rói seu osso, mas nada muda. Atormentam-se e atormentam os outros, sem nenhuma alteração produtiva. As pessoas que precisam evitar mudanças positivas, por uma razão qualquer, devem converter a culpa primária em culpa secundária.

O desejo de vingança pode ser também primário e secundário. A vingança primária possibilita a reconciliação porque liberta tanto a vítima quanto o agressor. A vingança secundária preserva a agressão e o desequilíbrio sistêmico, impedindo que se chegue a uma solução. Exemplo disso são as lutas de clãs herdadas de gerações anteriores. Os vingadores se acham no dever de cobrar prejuízos que não sofrem e seus atos se voltam quase sempre contra os que não fizeram nenhum mal.

A cólera tem formas primárias e secundária. A cólera primária purga um relacionamento e passa sem deixar cicatrizes. A cólera secundária contra alguém frequentemente se segue a um dano que lhe infligimos, e o ofendido tem boas razões para odiar-nos. Ficando encolerizados, rebatemos seu ódio. A cólera secundária, como a culpa secundária, é muitas vezes um pretexto para não agir. Nos relacionamentos, a cólera costuma ser utilizada para não pedir o que se quer, como: “Você nunca percebeu que eu necessitava de algumas coisas.”

Outro exemplo é o homem que se julga merecedor de um aumento salarial, mas nunca o pede. Em vez de procurar o patrão e negociar com ele, vai para casa encolerizado com a esposa e os filhos.

Quando o sofrimento é primário, os clientes suportam o que tem de ser suportado para, em seguida, juntar os pedaços de suas vidas e começar de novo. Quando o sofrimento é secundário, iniciam outra rodada de dores. Queixar-se de algo não passa, geralmente, de uma distorção secundária da aceitação da realidade.

A diferença entre o que fortalece e o que enfraquece aplica-se também a várias outras áreas, como o conhecimento e a informação. Podemos perguntar-nos: “Esse conhecimento facilita uma solução ou a impede? Essa informação estimula a ação ou a embaraça? O que está acontecendo fortalece ou enfraquece as pessoas, impulsiona ou anula a ação efetiva em prol de mudanças?” do que em promover mudanças construtivas. Extravasar sentimentos às vezes é bom, mas frequentemente obstrui a mudança. (…)

A terceira categoria engloba sentimentos tirados do sistema. Isso acontece quando a pessoa toma como seu um sentimento alheio. Achamos estranho alguém pensar que seu sentimento não é seu, mas de outrem. Todavia, por mais estranho que pareça, isso acontece muito nas constelações e geralmente é fácil de reconhecer. Depois que reconhecemos, passamos a vê-lo em outras situações. Sempre que nutrimos um sentimento alheio, somos envolvidos por algo que não nos diz respeito. Por isso nossas tentativas de modificar a situação costuma falhar.

Pergunta à Bert Hellinger: Estou muito interessado na ideia de emoções tiradas do sistema, pois tenho frequentemente essa experiência. Às vezes, fico irritado. Há algo de excessivo e impróprio nesse sentimento. Mais tarde, sinto-me bastante mal, como se não fosse eu a pessoa que ficou irritada.

Bert Hellinger: Sim, esse tipo de cólera e irritação costuma estar associado, a uma exagerada necessidade sistêmica de justiça. O desejo de vingança, tentativa de fazer justiça a alguém do passado, é muitas vezes extraído do sistema. Esses sentimentos são em geral bem menos fortes quando as injustiças foram cometidas contra o vingador. É como se a identificação com alguém de nosso passado de fato avivasse os sentimentos, assim como os sonhos avivam determinadas emoções.

(…)

Há ainda uma quarta categoria. Chamo-a de metassentimentos. Eles são de qualidade inteiramente diversa. Trata-se de sensações ou sentimentos destituídos de emoções. São energia pura, concentrada. Coragem, humildade (a aceitação do mundo tal qual é), serenidade, remorso, sabedoria e satisfação profunda constituem exemplos de metassesntimentos. Há também metaamor e metaagressão.

Um exemplo de metaagressão seria o que um médico gentil experimenta ao fazer uma cirurgia ou o que um terapeuta ocasionalmente sente. A disciplina necessária para fazer intervenções respeitosas e estratégicas é metaagressão. Intervenções estratégicas exigem autodisciplina absoluta da parte do terapeuta para atender realmente às necessidades e interesses do cliente; do contrário, degeneram em manipulações abusivas e consomem enorme quantidade de energia.

O remorso autêntico é metassentimentos. Quando o remorso é autêntico, as pessoas concentram-se em si mesmas e sabem que é conveniente para elas. O que fazem é então imediatamente possível, apropriado e eficaz.

Quando as pessoas se sentem mal por estarem na iminência de fazer algo que não convém às suas almas, temos um metassentimentos. Podemos chama-lo de uma consciência de ordem superior. Às vezes, é a única coisa que nos detém quando nosso grupo se envolveu num processo destrutivo.

Sentir o que é conveniente para a alma também nos impede de desempenhar um papel herdado do sistema. O papel tem consequências; influencia o que fazemos e experimentamos, o que cremos e percebemos, mas não promove a plenitude de nossa individualidade. Por outro lado, uma vez desenvolvida a percepção da metaconsciência, surgem critérios para avaliar o que realmente nos convém. Então as limitações impostas pela dinâmica sistêmica e pelos papeis desaparecem gradualmente.

O coroamento de todos os metassentimentos é a sabedoria. Ela está associada à coragem, humildade e energia vital.

Trata-se de um metassentimentos que nos ajuda a distinguir o que realmente importa. Ter sabedoria não significa conhecer muito, mas antes ser capaz de determinar o que é ou não apropriado nas circunstancias imediatas. A sabedoria nos ensina o que nossa integridade pessoal requer de nós em cada situação. Está sempre relacionada à ação. Os atos de um homem sábio não decorrem de princípios, as da percepção direta do que a situação exige. Por isso o comportamento de um verdadeiro sábio com tanta frequência nos surpreende.

Quando se manifestam, os metassentimentos, são vivenciados como dons. Não se pode força-los: eles vêm por conta própria, como bênçãos. São a recompensa da experiência de vida – frutos maduros.

O metaamor é propriedade fundamental do quinhão da vida e podemos senti-lo em todas as áreas de nossa existência, sobretudo nos relacionamentos. O metaamor, além do amor primário, dá aos relacionamentos força e segurança, sendo a fonte da verdadeira responsabilidade, confiança e fé.”

 

Do livro: A Simetria Oculta do Amor – Por que o amor faz os relacionamentos darem certo, de Bert Hellinger – Páginas de 219 `224. Editora Cultrix, São Paulo 2006.

Fabiana Quezada

Fundadora e desenvolvedora da SBDSIS | Advogada | Meta-coach
Consultora Sistêmica | Mediadora Consteladora…

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